Num sono profundo ela se encontra, fabricando histórias pra trazer ao mundo cinza um pouco mais de cor, um pouco mais de si. Não sabe-se dizer quando sonha e quando vive, a ponto de viver sonhando. Ver Alice sonâmbula me da vontade de gritar, mas todos sabem que não se deve acordar um sonâmbulo. Assim, alimentamos seu descanso com livros e contos de fadas para que viva feliz para sempre, ou até que acorde...
Algo que Alice deixa em letras miúdas é a verdadeira razão de seu sono. A adaga que transpassa seu peito se torna mais dócil que sua vida sem sonhos entorpecentes. Se veste de personagens, lê para que não sinta dor, na espera de uma breve reminiscência da ferida pulsante. Soterrada por frases feitas deve morrer na feliz ilusão de um mundo bom. Então Alice morre para viver seu sonho? Seja como for, sua angustia se encerra por aqui, não deseja mais suas mentiras sem mais prolongar sua vida. Meu anjo caido se mostra real aos olhos mundanos. Sem mais entorpecentes, desfalecendo o pudor e santidade e se agregando ao profano e pecador. Ao lembrar-se da adaga que transpassa seu peito, arranca sem dó, com o esboço de um sorriso masoquista e seus gemidos inefáveis de dor ecoando nas salas vazias do seu ser.
Seus olhos tornaram-se mais uma vez opacos à reluzente aura que emana de si. Liberta de um corpo fétidamente corrompido, Alice se levanta para o dia amanhecido. Sem mais tragédias ou escândalos, um dia ordinário sem mais nuances de cor. Sem o negro ou o colorido, sem o amor ou o ódio, sem o certo ou errado. Alice não vive mais sonho e pesadelo, é apenas indiferente á vida. E assim pode-se dizer em voz alta, sem mais temer. Adeus amar, adeus sofrer...
-Liesel Meminger
0 comentários:
Postar um comentário